Redação
Apesar de inúmeras negativas da entidade e da pressão do governo de Lula (PT) para esquecer o escândalo, não é por acaso que a Polícia Federal investigou e segue investigando os R$ 2 bilhões arrecadados pela Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares), no mesmo período em que R$ 6,3 bilhões foram furtados de aposentados e pensionistas do INSS, com descontos associativos ilegais, entre 2019 e 2024.
Ao autorizar a Operação Sem Desconto, em abril, o juiz federal Frederico Botelho de Barros Viana afirmou haver “indícios seguros” expostos pela PF contra responsáveis pela Contag. Na decisão do magistrado substituto da 15ª Vara Federal de Brasília, dirigentes da entidade associativa realizaram e seguiam fazendo descontos associativos indevidos de milhares de aposentados e pensionistas do INSS.
“[…] Observa-se das informações expostas pela autoridade policial a existência de indícios seguros do envolvimento dos investigados responsáveis pela Contag, entre 2019 e 2024, realizaram (e continuam promovendo) descontos associativos indevidos de milhares de aposentados e pensionistas do INSS, ação que pode ter ocasionado enriquecimento ilícito dos envolvidos”, disse o juiz, em sua decisão.
Mesmo diante de todas os indícios de fraude, dias depois da operação, Lula nomeou duas representantes da Contag para compor o Consea (Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional). Mas o gesto claro de acolhimento da entidade suspeita não estancou a investigação sobre “fundados indícios de lavagem de dinheiro” encontrados no fluxo financeiro atípico da Contag, detalhado em Relatórios de Inteligência Financeira (RIFs) produzidos pelo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras).
Nesta semana, a Folha revelou que a denúncia de que a Contag pediu descontos indevidos, sem qualquer autorização por escrito dos beneficiários, foi arquivada pelo Ministério Público Federal (MPF), em janeiro de 2022, após o INSS informar desconhecer as irregularidades. O caso que voltou a ser investigado na Operação Sem Desconto, deflagrada em abril deste ano 2025, foi arquivado pelo procurador da República do Distrito Federal, Nery Figueiredo, com o argumento de que não haveria “provas mínimas” para prosseguir a investigação.
Os indícios
Enquanto Lula irritou a oposição e vítimas por confessar pedir “cautela” aos investigadores de um esquema que roubou benefícios de brasileiros idosos, viúvas e pessoas com deficiência, a PF segue investigando o fato de mais de R$ 1,3 milhão dos R$ 2 bilhões arrecadados pela Contag com os descontos associativos ter sido direcionado para grupos de empresas e pessoas que não tinham nenhuma relação com a confederação.
A Contag registrou repasses suspeitos para entidades sindicais como R$ 10,53 milhões para a Fetag-BA (Federação dos Trabalhadores Rurais do Estado de Bahia), R$ 7,99 milhões para a Ferasp (Federação dos Empregados Rurais Assalariados do Estado de São Paulo), e R$ 5,21 milhões para a empresa Orleans Viagens e Turismo. Além de R$ 843,6 mil para a WJ Locação e Venda de Estruturas para Eventos, e R$ 737,8 mil para a Tutano Culinária Artesanal.
Veja mais suspeitas que recaem sobre a Contag:
- Aristides Veras dos Santos, secretário de finanças da Contag (licenciado), é investigado por pedir um desbloqueio dos benefícios para o pagamento de 34.487 descontos nas aposentadorias de agricultores associados. Pedido considerado irregular pela auditoria interna do INSS.
- Edjane Rodrigues Silva, secretária de Políticas Sociais da Contag (licenciada), é investigada por ter assinado o ofício que solicitou os 34,487 descontos. Ainda é alvo de suspeita sobre a compra de um apartamento de R$ 330 mil no Distrito Federal, em agosto de 2021, sendo agricultora familiar que produz milho e feijão em um assentamento de 14,5 hectares.
- Thaisa Daiane Silva, ex-secretária geral da Contag, é investigada por comprar uma casa de R$ 599,6 mil em Campo Grande, em fevereiro de 2022; e uma gleba de R$ 4,74 mil em Estrela Jaguari (MS), em janeiro deste ano, sendo agricultora familiar produtora mandioca, abobrinha, hortaliças e frutas.
- Alberto Ercilio Broch, vice-presidente da Contag, é investigado por suspeita de lavagem de dinheiro, transações de R$ 130,4 mil e envolvendo a empresa Max Cambio e Turismo. Além da compra de apartamento de R$ 1,62 milhão, em setembro de 2023, em Brasília, com suspeitas sobre a origem do dinheiro.
Contag nega esquema
Em 26 de maio, a Contag reagiu contra reportagens que narraram detalhes da investigação que associam seu nome a práticas criminosas. Veja o posicionamento:
Confederação reitera legalidade de ações e colabora com as investigações, mesmo sem qualquer indiciamento ou suspeita formal
A Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag) é uma entidade com registro sindical com papel essencial de defesa da categoria. A instituição acumula inúmeras conquistas para a sua base representada ao longo de mais de 60 anos de história.
A Contag, portanto, não é uma associação “recém-criada para vender serviços” como sugerem recentes reportagens em parte da imprensa atribuindo à Confederação a prática de descontos ilegais de benefícios de seus associados. A organização, na verdade, agiu em defesa à sua categoria representada por meio de ofício. Enviou, em junho de 2022, queixas ao INSS de aposentados e pensionistas rurais sobre descontos não autorizados por eles em favor de outra entidade, a Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais do Brasil (Conafer). Aposentados alegavam que não tinham qualquer vínculo associativo com a Conafer e nem com sindicato filiado à referida entidade.
Esse foi um dos esforços empreendidos pela Contag antes mesmo do início das investigações em curso – o que ratifica o apoio ao trabalho das autoridades para coibir práticas abusivas. “Temos todas as autorizações exigidas por lei para a realização dos descontos e seguimos firmes no nosso compromisso com a transparência”, afirma a presidenta da Confederação, Vânia Marques Pinto.
Também é inverídica qualquer alegação de que a Contag forneceu “listas falsas com o nome de pessoas que nunca autorizaram efetivamente descontos associativos”. Não há indiciamentos e nem suspeitas contra a organização nesse sentido. Além disso, a Contag cumpriu todos os requisitos do Acordo de Cooperação Técnica (ACT) do INSS.
Cabe também combater informações falsas a respeito da tradicional mobilização “Grito da Terra Brasil”, realizada pela Contag, Federações e Sindicatos filiados. O ato pode variar a cada edição, conforme estratégia de organização adotada, com mais ou menos pessoas nos estados ou na capital federal, e que a entidade foi recebida pelo atual presidente da República assim como ocorreu com mandatários anteriores.
DIÁRIO DO PODER